fevereiro 03, 2006

O BOM SAMARITANO

Era um dia comum. Fui ao centro da cidade hoje com minha mãe. Perambulamos bastante por suas ruas estreitas, estávamos pesquisando alguns artigos para pintura artística — meu atual passatempo e subterfúgio terapêutico.

O que mais me impressionou nisso tudo foi o fato de ela — minha mãe — estar apoiando, a sua maneira, esse dote artístico. Sua reação ao ver minhas telas não foi a que eu esperava, ao contrário manteve-se neutra, absorta. Fato evidenciado no dito popular, que ela mesma pronunciava caso a perguntassem o que achava:

— É como .. de Guede, nem cheira e nem fede!
Perguntei-lhe em dado instante o motivo pelo qual estava me incentivando. Respondeu que porque sim. E mais nada. Aceitei, meio incrédulo.

Mesmo apesar de ela não me colocar em seus braços e me dizer:
— Muito bem filho. Estou muito orgulhosa por você ser um grande artista. Pelo menos para mim! Mesmo assim aceitei.

No entanto — a coisa do Guede — já era um grande começo em nossa relação, não tão mãe e filho assim. Só o fato de ela ter gastado seu suado dinheiro em algo que até agora não houve retorno, para mim já foi o suficiente. Considero esta a forma que ela sabe de me dar afeto materno.

Ao fim do dia, encontramos um velho conhecido meu — sabe aqueles dias em que não se quer encontrar ninguém? principalmente de longa data, ou até mesmo aqueles dias em que se reza para não encontrar tal pessoa? — pronto! Lá estava essa pessoa, a nossa frente.

Ele veio em nossa direção, nos parou, me cumprimentou e então deu um beijo na testa de minha mãe, como forma de cumprimento a esta.
Você sabe o que é alguém que é aos olhos de todos um bom samaritano? O tipo de pessoa, que se não fosse tamanho egoísmo e inveja, gostaríamos de ser? Era ele. E quem ele pensa que é?

Em todos esses vinte e poucos nunca beijei minha mãe nem sequer no rosto, que dirá na testa!
Fez-me sentir a pior pessoa do mundo, o pior filho do mundo. Maldito acaso!

CONSELHO: Nunca atravesse a vida sem olhar os dois lados antes. Pode ser que apareça um espertinho para lhe lembrar o quão podre e miserável você é, e ainda por cima ele pode dá um beijo na testa de sua mãe, a pessoa que você tem menos contato afetivo. Quando se gostaria que fosse o contrário.

texto de 2001

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